terça-feira, 29 de novembro de 2011

ALEMÃO: TEMOS QUE NOS ORGULHAR DOS NOSSOS SOLDADOS, DIZ GENERAL


General Adriano Pereira Júnior: ‘Vamos fazer uma operação mais forte antes de sair’

Elaine Gaglianone e João Antônio Barros
Nos últimos 12 meses, é o antigo QG do tráfico que interrompe o sono pelo menos três vezes na semana do general Adriano Pereira Júnior, comandante Militar do Leste e responsável pelo policiamento nos Complexos do Alemão e da Penha. “Embora não viva lá, vivo aquilo lá todos os dias”, repete o oficial, que elege a missão como a maior da carreira de 48 anos no Exército. “Quantas vezes na vida nós temos uma oportunidade dessa, de ajudar tanta gente?”. Em março, começa a passar o bastão da ocupação para a PM. Antes, fará ação com o Batalhão de Operações Especiais (Bope) para vasculhar casas onde restam armas escondidas. Classifica as comunidades como os bairros mais policiados do Rio, mas isso não livrou a população do medo. “Ela tem medo. O medo ainda é maior”.

As comunidades são seguras?
A população quer a paz, 99% nos apoiam. Aquilo lá não está totalmente em paz, mas é um bairro policiado. As pessoas que compravam drogas lá devem estar procurando em outra região, porque o policiamento é muito grande. Hoje, 98% do tráfico são para o público interno. As bocas são itinerantes.

Ainda há traficantes?
Eles estão lá dentro, saíram na invasão, naquele bolo, e depois voltaram. A maioria não tem antecedente criminal. Mas a população sabe quem era ligado ao tráfico. Então, a população tem medo. Imagina quem mora lá dentro e sabe que esse homem é ligado ao tráfico, ele passa e faz ameaça. Ela tem medo. O medo ainda é maior.

O chefe do tráfico está lá?
Nós temos informações de que de vez em quando o Mica (Paulo Rogério de Souza Paes) vai lá, mas não vive lá. Ele não fica ali dentro. Acredito que ele vai lá mais para mostrar presença, dentro da perspectiva de que um dia retorne, para dizer: ‘Olha, eu ainda estou vivo, eu tô aqui e ainda mando aqui’. Agora, nós estamos atrás dele, nós vamos pegar ele.

Ainda há perigo nas comunidades?
Hoje nós temos segurança na área, a população está segura, se você for considerar número de homicídios, tanto em assalto, tudo caiu barbaramente. Estamos numa área das mais seguras do Rio. Não há bairro tão policiado. Estamos empregando 1.200 homens. Eles ficam lá, dormem e trabalham, não têm folga. Não tem sábado, domingo, feriado. Desses, 800 homens estão nas ruas 24 horas.

Os moradores apoiam a ocupação?
No dia 25 de dezembro eu fui à missa de Natal na Igreja da Penha. Após a missa, uma senhora perguntou se eu era o chefão, que queria dar um abraço no chefão. Perguntei a razão e ela respondeu: ‘Agora tenho direito de dormir’. A residência dela é na Praça São Lucas, na Vila Cruzeiro, local da festa dos traficantes do Complexo da Penha. Eles botavam uma mesa enorme com bebida, drogas e funk, os baladões do funk. E ela não dormia. Ela foi agradecer o direito de dormir.
Com traficantes na comunidade, não há risco de confrontos?
Nós temos uma norma lá: fazer uma prisão é importante, mas se ela oferecer risco para a população, não prende. Em primeiro lugar a segurança da população. Nós não estamos num campo aberto. Estamos numa área onde crianças estão brincando, as escolas funcionando e o comércio aberto. Então, não faz operação. Vão pegar mais à frente. Vai ter outra oportunidade. Ele vai dar sopa. Não adianta estar lá, fazer muita prisão e ter gente machucada.

Mas ocorreram confrontos no Complexo do Alemão.
Os episódios de setembro foram uma armação. Para entender: a renda do traficante não está só na droga. Tá no gatonet, no gás. Uma semana antes do problema (conflito entre homens da Força de Pacificação com moradores) fizemos operação junto com a ANP (Agência Nacional de Petróleo) em cima do gás. Eles foram multados e o material apreendido, e já tínhamos atacado o gatonet. Aí saiu a notícia de que o Exército ficaria até junho, não iria sair em outubro. Não acredito em tanta coincidência. No domingo, veio o problema no bar. Aquilo tudo foi armado.

O que exatamente aconteceu no bar?
A patrulha passou e viu os dois suspeitos. Aí faltou experiência para saber que não era o momento. Aquele grupo no bar se rebelou e não quis deixar a patrulha fazer a checagem. Isso desencadeou o desentendimento e houve disparo de munição não letal contra as pessoas que estavam tentando agredir a patrulha. Aí, no dia 5, houve o protesto, com faixas muito bem feitas, tinham 53 pessoas. No dia 6, aconteceram os tiros de fuzil do Adeus, da Baiana e um ponto de dentro da nossa área, que veio da Penha

Era o tráfico contra o Exército?
As imagens mostram que eles não estavam tentando atirar contra a tropa. Os tiros foram a esmo. Eles queriam fazer terror. Primeiro foi o gás, depois a notícia de que ficaríamos até junho. Acho que domingo aconteceu meio por acaso e, segunda e terça, foi o aproveitamento.

Os tiros o assustaram?
Foi triste ver bala traçante de novo cruzando a cidade. Li mensagens na Internet, de pessoas que estavam na Grota e diziam: ‘Estou ouvindo tiro, o trabalho (do Exército) estava tão bom, será que vai voltar ao que era?’.


E vai voltar, general?
Não vai voltar. Enquanto o Exército estiver lá é ponto de honra que aquelas pessoas continuem vivendo bem. Não há mínima condições de eles voltarem. Se tentarem, tenho 1.200 homens empregados lá e boto mais mil, mais dois mil homens. A missão é para ser cumprida, e a minha missão é preservar a segurança pública no Complexo do Alemão e na Penha.

A invasão da Rocinha foi melhor do que a do Complexo do Alemão?
A Rocinha talvez tenha sido a operação melhor executada e muito bem planejada. A polícia antes entrou algumas vezes lá e fez alguns estudos e verificações. Com um trabalho de inteligência. Quantos líderes foram presos na Rocinha antes da ocupação? Quando fez a invasão, está lá com a tropa especializada, que é o Bope, fazendo o vasculhamento. Tá tirando de lá o armamento, drogas, material ilícito. Quando o Bope sair, vão chegar as UPPs e a área tá limpa. Essa é a sequência. No Alemão não teve a sequência. Um mês foi pouco para o Bope fazer a limpeza naquela área.
          
Arte: fonte: jornal O Dia


Ainda existem armas e drogas nos Complexos?
Existem. Esse material ficou lá e é um risco. O traficante vai querer entrar para retirar e pode render também ações de pessoas ligadas ao tráfico, inclusive policiais, que queiram entrar lá para retirar esse material. Isso nós sabemos que pode acontecer.


Há armamento enterrado?
Enterrado, não acredito. Nós encontramos tonéis enterrados lá na área da mata, mas já vazios. Nós apreendemos muito material. Ao término de nossa missão lá, antes de sair, vamos ter que fazer uma operação mais forte, de vasculhamento, até com o Bope junto conosco, para implantar a UPP. Eu acredito que o material que estava fora nós já apreendemos. Mas dentro de casas tem.

Quando o senhor começa a passar o território à PM?
Houve uma negociação minha com a Secretaria de Segurança Pública e, a partir de março, eles começam a instalar as UPPs no Alemão. Nós vamos progressivamente passando as áreas para o governo do Estado. Tudo estará concluído até 30 de junho.

Foto: Severino Silva / Agência O Dia


O senhor acha que a tropa fica exposta em comunidades carentes?
Nós treinamos para isso. Nós preparamos o nosso soldado. Eles fizeram treinamento específico de dois meses, com uso de arma não letal, como se comportar, conheceram a legislação. Está sendo incutido na cabeça do soldado como ele deve agir. O militar é preparado para cumprir missões. Nós fazemos estradas, e não matamos ninguém fazendo estrada. Nós atendemos nas enchentes. O militar brasileiro é diferenciado, é considerado o melhor pela ONU.

                                
                                                 Exército em missão de paz no Haiti


Operações policiais acontecem diariamente no complexo
Foto: Adriano Ishibashi/Futura Press

O soldado brasileiro é um modelo?
Temos que nos orgulhar dos nossos soldados. As Forças Armadas dos Estados Unidos já vieram conversar comigo. A última foi a chefe de gabinete da secretária de Governo, Hillary Clinton. Eles querem saber como é que o Exército consegue atuar dentro de uma área dessa, que não é um campo de batalha. É o que eles enfrentam no Iraque. É trabalhar numa área humanizada, onde a população tem que ser preservada. A nossa maior missão lá (Alemão) não é prender bandido, como a deles (americanos) no Iraque não é prender o terrorista. É manter a população em segurança.

O senhor tem meta no Complexo?
Um dia eu falei com o governador (Sérgio Cabral) que tinha colocado como meta que, ao final do nosso período de ocupação, nós estaríamos fazendo o policiamento desarmados. E ele assim: ‘Não faça isso, não bote os seus homens em risco’. Respondi: ‘Não governador, essa é uma meta que serve para balizar, um farol que sei que não vamos chegar, porque temos os pés nos chão, mas é um farol que vai balizar as minha ações’. Ou seja: eu entro lá com fuzil, depois vou diminuindo para pistola, vou diminuindo para arma não letal. Eu tenho que ir diminuindo a ostentação de armas até para reduzir o clima de conflito e violência. Se vou conseguir, não sei ainda.

Como o senhor avalia a ocupação dos Complexos do Alemão e da Penha?
A gente, às vezes, não avalia corretamente as coisas. Para nós, que vivemos em outros bairros e nunca vivemos numa área dessa, não representa muito, todo dia de manhã, mandar os filhos à escola sabendo que eles vão encontrar a escola aberta e voltar no final da aula. Para quem não tinha essa segurança, quanto representa isso? Muita gente fala mal das ações do governo. Estão faltando ações sociais, mas melhorou muito. Aquela comunidade está agradecida. Eles telefonam, mandam e-mails.
O DIA ONLINE/montedo.com

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